7.3.08

Cada vez que me cobri com a tua pele, me anulei. Cada vez que mendigava por uma notícia tua, desesperei por dentro. Os segundos da tua ausência se tornaram cada vez mais presentes no meu dia-a-dia e, aos poucos, fui me tornando tudo aquilo que um dia disse que jamais seria. Me isolei de mim mesma, não questionei as feridas que lentamente se abriram sobre a pele,outrora retalhada para receber a tua, e com isso, formei crateras. Ao fazer os remendos -sem levar em conta a dor provocada pela agulha- maquiava as cicatrizes para entenderes que ali estava por completa, sem vestígios de alinhavo. Criei tantas lacunas dentro de mim que foi impossível continuar em pé, e pior: desabei aos teus pés.
Olhar no espelho e consegui entender cada ruga brotada no meu rosto é muito mais doloroso. Dói sentir os meus pedaços no chão e perceber que o estrago foi porque eu permiti, foi por que fiquei tão frágil ao ponto de qualquer ato falho teu conseguir arrancar os bons meus. Quebrei. Escuta de novo: que-brei. Estais feliz agora?
Não consigo sustentar as minhas pernas por causa do meu mal hábito de moldar-me em você. Desaprendi a andar justamente para seguir as tuas caminhadas de trilhas previsíveis. Os anos passaram, as coisas mudaram e me tornei a mesma pessoa de sempre: vulnerável a cada oscilação de humor tua.
O engraçado é que abria a boca e dizia: “eu te amo!”. Como? Como? Como pude dizer tais palavras se nem ao menos amar a mim mesma eu conseguia? Acho que te amar era uma saída mais fácil para tudo aquilo que me atormentava. E quando vinha o tormento, se não estavas por perto, aquelas bolinhas pequenas e soníferas te substituíam tão bem!
Percebes o que me tornei? Quem diria que aquela menina tão bonita por quem tu te apaixonasses iria ser essa mulher em frangalhos que desse um adeus frio.
Hoje, cansei de me olhar em pedaços, sair em desespero atrás de linha quando resolvia botar a cabeça para fora da janela, viver em companhia das remendas feitas com pressa no meu corpo. Cansei. Demorei muito para conseguir abaixar e catar cada átomo solto pelo espaço, e confesso: só consegui quando pude sentir a agulha vinda da minha própria mão. A cola para os meus pedaços mais frágeis vinha de dentro.
E assim fui colando aqui, costurando ali, até ficar em pé. Não discursarei em voz alta sobre a minha vitória, afinal, ainda estou engatinhando sobre a minha vida. Apenas digo: com meus pedaços no devido lugar, consigo entender aquela música que cantava no teu ouvido “que o sonho será interminável, que a vida será colorida, etc e tal”.

8 comentários:

Miss Joo disse...

Olá, Clara!
Bela esta declaração que faz pensar que apesar de tudo há sempre um sentimento que continua a exalar pelos poros de uma pessoa. E não interessa qual sentimento seja o importante é que ele exista e que nos faça continuar a viver.
Até...

Fernanda Papandrea disse...

"Não consigo sustentar as minhas pernas por causa do meu mal hábito de moldar-me em você."

como sempre um texto belíssimo!

Ana Cláudia Zumpano disse...

vc escreve, descreve os sentimentos de uma forma que eu gostei muito, obrigada pela visita!
lindo! quantas vezes já me vi em situações assim...
bjo ;*

nj.marabuto disse...

oh doce menina-boneca-de-pano-recosturada! x) sua consciência é inspiradora e animadora.

ressalto:
"O engraçado é que abria a boca e dizia: “eu te amo!”. Como? Como? Como pude dizer tais palavras se nem ao menos amar a mim mesma eu conseguia?"

beijos

Juliana Campos disse...

[...] sem ar!
nossa você realmente tem o incrível dom de passar para o papel/tela os sentimentos mais remotos escondidos no fundo da alma de muitos.

Camilinha disse...

Sem brincadeira: chorei. choro bom, de cura...

beijos daqui...

Camila Vivas disse...

Estar colando-se é um ótimo passo pro seu samba de vida.

Queria estar como você, mas pétalas de mim ainda voam por aí.

Lindo texto!

Parabéns!

Voltarei aqui com mais tempo pra ler as suas outras divagações.

=)

Anônimo disse...

Clara, outro texto profundo e cheio de emoção!

É muito bom ler teus escritos.


Super Beijo.