30.6.09

Clara, Ana e quem mais chegar.

Uma comportava-se como bailarina,
gestos delicados, postura reta e
pés
firmes. Seus passos eram
coreografias e a vida era música que inundava sua
alma,
lentamente, devellopé. A outra andava nas passarelas – um
sonho de
menina
que reunia as sandálias no chão e as ordenava para um
desfile, sem
passarela, em um quarto largo - postura, elegância e os flashes
reconhecendo seu
rosto. Essa aqui se imaginava com coxas grossas, cabelos
compridos e bem cuidados,
maquiagem bem feita e uma roupa da moda,
sucesso
profissional e bem reconhecido,
fluente em oito línguas,
disputada no
mercado e com fome de conhecimento.
Já a outra era
pequena, delicada,
explodia qualquer coisa que fosse luz e
tivesse uma
intensidade estonteante,
para isso, criava asas, jogou fora o livro
de
boas condutas, andava descalça
sem medo de espinhos ou vidros, era
espontânea
e achava o máximo ser fiel as
suas vontades. Essa sorria e
era colorida. Outra desafiava a
gravidade, maior sonho: ser
trapezista. Nesse mesmo sonho ela possuía
equilíbrio e força suficientes
para voar, rearranjar-se em cordas, sem redes
de
proteção, ela se
jogava, não tinha medo de cair, apenas fechavas os olhos
e
garantia que
aquilo sim se chamava paz. Seu corpo era preparado para o
desafio,
para
viver com a alma latejando em cima de um palco e, assim que o
espetáculo
acabasse, cair de volta no mundo. Isso, mundo, tinha uma que só
queria o
mundo e
nada mais. Os olhos dela transpareciam cada pedaço de
detalhe
que havia guardado
nas veias, como fotografias de um álbum
abarrotado.
Tudo era pouco, essa queria
o além mais. Precisava de um
parceiro
compatível com sua sede de vida, de arte,
precisava ser orquídea.
Tinha
aquela também que não era nada disso, pelo
contrário, chorava,
chorava,
chorava mesmo que em vão, mesmo que em um vão. Essa
não admitia
suas
fraquezas, sentia-se franzina, feia e ridícula por tentar ser o
que
jamais seria. Tinha uma mais despojada, mas com os mesmos cabelos cuidados e
uma Inteligência de dar inveja,

nossa, como ela

queria ser tanta coisa, como
essa tanta coisa envolvia tanta gente que ela nem mesmo conhecia.

Isso, essa
coisa de conhecer o desconhecido e assim transformar era o principal foco da
menina. Havia uma louca, impulsiva, bebia demais, fumava demais, drogava-se
demais e, após o efeito dos paliativos, tomava um rivotril para acalmar os
ânimos. Era independente, andava no salto, despertava paixões instantâneas
com a
duração de uma noite bem feita de sexo. Após isso, ela ia para
casa,
tomava
banho e se rasgava em letras para alguém ou para ninguém.
Ela é
exagerada. Sabe
aquela? Aquela era meio hippie, meio natureba,
misturava-se.
Um dia, deu a porra
louca e ela foi morar em uma
comunidade livre, levou na
mala uma máquina
fotográfica e uma caneta.
Teve cinco filhos para aprender o
que era amar, seu
grande barato eram
as pessoas. Tudo bem, essa tinha um quê
de revolucionária.
Não admitia
injustiças, doava-se a uma boa causa. A de
lá, encostada no banco,
tem
pavor de ver a vida passar e não ter história,
esse é seu grande medo –
depois de perder quem ela ama, claro – e por causa
disso, cada não ida,
cada
quase, cada desperdício é uma porta de entrada ao
suicídio, o medo
a impede de
sair de casa, a ansiedade atrapalha seus dias e
a deixa na
cama, tentando não
pensar, sentir, falar, ela sente dores na
parte
esquerda do corpo. Aquela que
anda de um lado para o outro, tem
certeza
que não cairá nunca, acha-se que é
forte, os outros confirmam,
parece um
muro das lamentações, mas, dizem as más
línguas: por dentro, ela é
toda
costurada, inclusive, há retalhos que não
agüentam mais linhas.


Existiam tantas, ora
camufladas, ora misturadas. Mas, espera,
escuta o
barulho: elas
gritam.

4 comentários:

...loucos apontamentos disse...

Elas são.

Belle disse...

Me vi um pouquinho em cada uma delas e de repente me bateu uma vontade louca de gritar!!! Lindo post!

Jaya Magalhães disse...

Dulce, Dora, e um pouco de Clara e Ana.

Sei lá cadê eu. E o melhor: não me importa.

O texto é.

Beijo, Claritcha.

Graziela C. Drago K. Zeligara disse...

Obrigada por tê-lo escrito.
Lindo.