22.2.08

Querido,
Ontem quando soltavas as tuas dúvidas sobre mim, me mantive em pleno silêncio. Não conseguisses entender as palavras saídas dos meus olhos que respondiam as tuas perguntas, nem tentasse adivinhar se tinha inventado uma metáfora nova para um discurso antigo. Encarasse a minha falta de som de maneira trágica e conseqüentemente, o barulho impediu que as minhas palavras silenciosas chegassem aos teus ouvidos. É no silêncio que componho as minhas melhores poesias.
Fui ao avesso do meu avesso naquela madrugada, escavei cada pedaço da alma e me encontrei em um canto qualquer. Fiquei impressionada no que me transformei, ou melhor, no que me propus a ser: um pedaço de carne que não sente nada de diferente, nada proveitoso. Um dia vestia-me de uma mulher segura de si, em outro era uma menina infantil que só precisava de um colo. Fantasias. Personagens inúmeros de uma pessoa que não sabia o seu papel principal. Fui, aos poucos, me esquecendo de quem era de verdade, propositadamente para não ter que me encarar no espelho, não ter que discordar das tuas verdades com os meus argumentos que se tornaram falhos. Eu me tornei falha.
Interrompi as lágrimas ácidas e aos poucos fui arrancando, uma a uma, as peças de roupa sobre o meu corpo. Cada pedaço de fazenda retirado era uma característica inventada, um pedaço perdido de uma história qualquer mal resolvida. Me despi por completa, achei a minha essência. Mesmo com todas as variações, reconheci a minha matéria-prima; mesmo com toda a insegurança resultante de passos mal dados, pude transcrever-me em soneto.
O que não percebes é a semelhança em todas as minhas variações: a minha essência. Essência? Aquilo que fica quando tudo parece ir embora. A capacidade inenarrável de ser exatamente o conjunto de sentimentos adquiridos durante esses anos, uma seqüência ilógica de coisas, uma atrás da outra. Feita da mesma matéria, todas as vezes.
No meio dessa transitoriedade incessante a que chamas de vida, levo só as minhas pinturas. Assim como o papel outrora em branco aquarelou-se de verde, vermelho e amarelo, aquarelo-me ora em azul, ora em violeta. Todavia, não deixo de ser um papel em branco. Azul , violeta, verde são cores, eu sou o pincel.
Leve as fotos com você para lembra-se sempre do prazer que é ser feliz. E ao olhar para o teu lado, nas imagens congeladas, verás o meu sorriso sincero, o brilho que salta dos meus olhos, características ímpares da minha alma.

Sorria.

13 comentários:

Anônimo disse...

Clara, achei lindo! Não há nem o que dizer... (mas ainda assim achei triste.)

Filipe Garcia disse...

É no silêncio que componho as minhas melhores poesias.

o silêncio fala tanta coisa... faz a gente escutar a música de dentro.

parabéns pelo texto.
bonito e sincero - duas qualidades que se repetem em tudo q escreve, aliás.

Nando Damázio disse...

Oi, Clara !!
Nossa, que texto lindo, comovente, profundo, um pouco triste .. Gostei muito !!

A maior parte da minha vida passei no silêncio, me identifiquei muito com essas palavras ..
Gostei do seu blog ..
Té + !! ;-)

Anônimo disse...

Esse seu texto preencheu o vazio que meu peito carregava há alguns dias...

obrigada

beijos daqui...

Tata - A Moderninha disse...

Amiga vc está precisando ler o meu texto "Dando a Volta por cima"

Não se sinta um nada guria!!!! Vc é tudi para vc mesma e isso basta...Seja o pincel para colorir a sua vida..as cores para ter brilhos só depende da maneira de como vc as chamam...exemplo: Amarelo ou Amarelo Sol, Azul ou Azul Céu, Vermelho ou Vermelho paixão!!!...

Veja o novo dia q esta amanhecendo bem a sua frente através de sua janela....

Beijokassssssssssssssssssss

Miss Joo disse...

E não existe nada melhor que sorrir, além de pôr uma imensidade de músculos a mexer faz bem para a saúde. Obrigada por nos ofereceres mais um post maravilhoso.
Até...

Fernanda Papandrea disse...

"Um dia vestia-me de uma mulher segura de si, em outro era uma menina infantil que só precisava de um colo. Fantasias. Personagens inúmeros de uma pessoa que não sabia o seu papel principal. Fui, aos poucos, me esquecendo de quem era de verdade, propositadamente para não ter que me encarar no espelho..."
parece que confessou por mim essa frase..

lindo!

Anette Alencar disse...

" Essência? Aquilo que fica quando tudo parece ir embora"

e isso, aprendi contigo!

nj.marabuto disse...

entre tantos sentires, me fez bem ler. obrigado. ;)

banzooo disse...

Incrivelmente intenso!

[Ana Clara]

Anônimo disse...

Maravilhoso!

Clara, tudo aqui é um poço de profundidade e sinceridade. Tudo muito claro e direto.

amei!!

Anônimo disse...

Eu tava só passando por aqui, mas não pude deixar de comentar - tá lindo esse texto, em cada frase, em cada vírgula. Você escreve muito bem (:
beijos

Fernando Locke disse...

Muito bom! triste, profundo, mas tem um certo tom de "eu vou superar, vc vai ver!". não sei pq, mas me lembrou uma musica da Legião Urbana, do Cd A tempestade,não lembro o nome da musica, mas sei que começa: "Vai, se vc precisa ir,não quero mais brigar esta noite, nossas acusaçoes infantis e palavras mordazes..." boa musica. Seu texto foi bem profundo,bem tocante, e a sofreguidão n qual ela se despe! abraço!