27.7.09

Tenho medo de te esquecer. Eu confesso. Parece meio repetitivo, coisa de criança, que seja, não me importo. Não foi à toa que tatuei uma estrela no meu ombro direito – além de um bom livro recheado de teorias que tocam a alma, veio a minha necessidade de ter uma estrela pra vida inteira. Inteira, cintilante assim como você veio para mim. Aquela saia de estampa colorida, rodada, com o cigarro na mão – tentando disfarçar, se fingindo de forte- e eu, atrás de você: “ Voinha, faz cafuné?”. Teus dedos doíam porque, na verdade, não era bem cafuné o que eu queria, era aquele negócio que só você sabia o nome, um carinho teu, só teu. E você falava “ Clarinha, eu não agüento mais”. Eu só fazia retrucar “mais 5 minutos, Vó, por favor.” Me jogava em você, de cabeça baixa, esperando carinho, esperando teu colo. Ou te via dançar, abobalhada, os passos mais difíceis de frevo, dizia que um dia queria saber fazer aquilo. Uma cena que nunca esqueço é você, sentada no terraço, comigo, trazendo pipoca para as minhas bonecas. A saia rodada, Pluto atrás de você, Magrela do outro lado, aquela casa que sempre foi ninho ao redor, o cheiro. As brincadeiras no jardim, os abraços apertados, você correndo atrás da gente, completamente sujos de areia – aquela que você tinha reservado para as sua roseira – com um chinelo que nem fazia cócegas. Aí você desistia e, no fim, chegava à solução que o que nós merecíamos era um bom banho de mangueira. “Esses meninos...”, saia dizendo pelos cantos da casa. O bolo solado, a carne cheia de cuminho, especiarias tuas que eram tão especiais, a mesa cheia de gente só para te ver, só para estar perto de você. É que você sempre foi porto-seguro, sabe? Teus braços, que tanto me carregaram, sempre foram abrigo, aconchego. Se agora as minhas lágrimas caem, como tantas vezes, é que a tua ausência ainda pulsa por aqui por dentro desesperadamente, é como correnteza forte, vai arrastando tudo. É só pensar em lembrar de você ou a angústia de te esquecer, meu coração se perde dentro do corpo de tão pequeno,sabe? Eu vou me encolhendo, me encolhendo e termino que nem um grão de feijão – um daqueles que você me ensinou a plantar com água para o colégio.
Eu agradeço cada segundo que tive o enorme prazer de estar do seu lado, os primeiros e os últimos. Se eu pudesse ter feito mais alguma coisa, juro, não hesitaria um milésimo de instante, te juro, até a minha vida seria tua, todinha. Eu ofereci, naquele dia, mas você não quis, sussurrou no meu ouvido que agora era a minha vez, você tinha cumprido sua missão e me quer sorrindo, me quer clareando. Eu vi a sua cara de felicidade quando eu toquei na máquina de escrever, ela vai ser minha, já está acertado.
Foi justamente na infância, na hora em que os ponteiros tentam arranjar uma hora certa, que você me apareceu e eu fui aprendendo a ser feita de amor. O teu amor foi minha grande herança, muito mais do que aquele colar com a foto do meu avô, muito mais que a Polaroid, muito mais que tudo. Teu amor me alimenta, Vó. Te sentir viva, dentro de mim, é como acordar em um dia azul. Pirrita, me deixa chorar, deixa. É só amor transbordando, não é sempre assim? É essa falta que não passa nunca, não cura nunca. Sangra, sangra, sangra. Mas deixa, deixa pra lá, fica aqui, é o que importa.
Justamente hoje, no dia dos avós, que presente ou ausente, não importa, eu ainda preciso dizer que te amo. E vou dizer isso durante todos os dias que eu precisar, que a tua foto estiver estampada no meu corpo, nos meus olhos, na minha fisionomia. Enquanto eu tiver o teu colo, esse sim, sempre presente e as tuas mãos acariciando o meu cabelo, vou dizer que te amo. Te amo, te amo, te amo. Até quando você estiver viva, aqui, dentro de mim, meu amor é teu.

E a você que me deixou o legado das letras. E me ensinou que amor é uma coisa que ultrapassa fronteiras, inclusive carnais. Um dia a gente se (re)encontra.
Feliz dia dos avós.
Com muito, muito amor ..
Clareana.

9 comentários:

Erica de Paula disse...

Que coisa linda!!!

Bjos mtos pra vc querida!

kátia disse...

Quinha,você tem a capacidade de entrar na alma da gente e buscar todo sentimento que a gente possui.
Obrigada por continuar "clareando" todos nós.
AMO TU!
Bj

Mãe

H L disse...

eu já perdi minha avó materna. era como uma mãe para mim...
ainda tenho a paterna, tão cuidadosa, tão linda, tão fofa!!
*-*

Lindíssimo o texto

Viviane Gondim disse...

Um dia vc ainda me mata, eu to aqui escrevendo e chorando, chorando muuuiiitttooo, vc não tem noção...

Só Deus sabe o quanto eu AMEIII essa minha tia, q era muito mais avó e o pior acho q nunca tive oportunidade de falar isso a ela...
Vc me fez voltar anos no tempoo...

Lindooo, perfeitooo... Acho q ninguém conseguiria descrever tão bemmm como vc fez...

Te amooo!!

Marguerita disse...

Aiii! Eu chorei, pronto, disse!

Que lindo, como todo amor verdadeiro tem que ser.
Beijos, Clara.

Graziela C. Drago K. Zeligara disse...

(respondendo o comentário)
sempre vem da alma?
E vem só da alma?
O que é a alma?
Um beijo!

Clarissa disse...

Clara, menina rara! Não era para rimar, mas nome que é poesia sempre dá rima. E o teu ainda tem afinidade com Luz! Não me parece surpresa sua história de vida, como a que relata com sua avó, ser tão especial. Tb estás nos meus caminhos lá do blog. Beijos, querida!

Anônimo disse...

não só o amor ultrapassa fronteiras, tuas palavras com toda certeza pegaram carona no vento, subiram, foram até ela. Clara Clara, coisa linda isso daqui. estou sem palavras, sem colo, sem abraço..

intenso, sabe?

ps: quantas Claras em tão curto espaço de tempo. primeiro a minha, depois a da fernanda, agora a sua-você. é. Clara é o nome

:*

Unknown disse...

clarinha, não existem palavras para descrever os sentimentos que você desperta.
Obrigada por você existir.
te amoooooooo