28.6.10

Três da manhã

Eu não queria te dizer absolutamente nada. Apenas te olhar. Deixaria de lado todas as tuas dúvidas que fiz questão de negar respostas, por mais obviedade que possuam e continuaria te olhando, de perfil. Aí eu lembraria que esse teu pescoço já foi o meu cheiro favorito e que é na nuca o teu arrepio. Lembraria disso em silêncio. No máximo, deixaria escapar algumas palavras do meu sorriso e outras dezenas dos meus olhos marinhos. Enquanto você faria alguma piadinha sem graça por falta do que dizer ou porque o cigarro não está nas tuas mãos e você não sabe bem o que fazer com elas, eu iria lembrar dos segundos que te ter era a sensação que eu gostava de sentir. Na verdade, eu sabia que eu não te tinha, mas a delícia de te ver ali irradiante e constatar que eu era a pessoa que estava ao teu lado, mesmo que temporamente, mesmo que, era o grito que faltava, era a leveza que se somava a minha pose de bailarina.
Eu não queria te dizer absolutamente nada, apenas me deixar levar pelo dia calado, pelas batidas descompassadas, pelo silêncio que foi cortante e que tentamos amordaçá-lo com um beijo, pelas mãos que tinham medo de se encaixar. Não era arte, nunca foi. Não era amor, nunca foi. Era para reviver, desabrochar. Era rima pobre que precisava dos meus versos exigentes. E se não tivesse essa dor? Melhor era tudo se acabar. Era um sorriso certo, um dia. Era a certeza da tua beleza completamente humana, errada. Era uma aposta com a minha capacidade de ir apenas ao perto, ao palpável. Quando perdi você, ganhei a aposta.
Eu não quero te dizer absolutamente nada, só me deixar aproveitar o que resta dessa tranquilidade implantada aqui por dentro. Aproveitar a tua existência e a mentira do quanto me importo com você. Inventar a saudade. Bater a porta. Fumar um cigarro. Sair morrendo de medo do desejo de ficar. Fazer poesia. Sei lá, eu não quero te dizer absolutamente nada.

2 comentários:

Renata Evellyn disse...

Por que as coisas não ditas são aquelas que aplacam a alma? Quem entede?

Marguerita disse...

"Sair morrendo de medo do desejo de ficar."

Vixiii, me identifiquei!

;)